domingo, 25 de dezembro de 2016

sobre isso não ser um poema

Mordeu os lábios
de olhos fechados
respirou fundo
de olhos abertos
olhou as estrelas
arrancou um tufo de grama
e o ar entrou
e saiu
de boca aberta
sem som
e o ar entrou e saiu
e já não sabia mais 
se o que brilhava no teto era o efeito da luz da rua ou se era o infinito do céu
se o barulho da rua era o mar ou nada mais

e o colchão e os lenções pareciam fazer parte do corpo.

e toda a terra e grama parecia fazer parte do corpo.

domingo, 18 de setembro de 2016

Sobre os segredos do universo em duas bocas

Primeiro, por que ela largou ele e veio pra mim agora? Por que ela me pediu um beijo bonitinho? Ela nem gosta de gurias! Em que estado psicológico essa situação pode se encaixar? Bom, eu não posso parar agora, até porque não tá ruim, então vou simplesmente ficar aqui pensando em tudo que eu tenho pra pensar. Nossa, ela realmente não vai parar, vou até abrir um olho pra ver quem tá em volta. Por que as línguas fazem isso? Tô aqui mostrando o funcionamento das línguas! Por mais que esteja bom, dá pra perceber a diferença, né?! Ela não beija mal, mas é tão diferente, tão outra coisa que eu sinto. Mas o que eu sinto? Na verdade, nesse momento, não muita coisa, só vontade de entender todos os mistérios do universo mesmo. 42. Mas lá, ah! Era tão fofinho, eu queria muito que fosse com ela aqui agora, é sempre tão bom sentir meu corpo junto do dela, minha boca na dela, é uma coisa tão fofa, tão demais! Aqui eu nem sinto isso. Uau, ela tá passando a mão pelo meu corpo, meu deus, por quê? Ah, eu lembro como se fizesse poucos segundos, o toque da menina de quarta-feira, que na verdade eu senti pela primeira vez naquele mesmo lugar. Opa, eu não deveria sorrir enquanto beijo, não nessa ocasião! Olha que bizarro, minha língua na boca dela! Cadela. Blé, na verdade isso só tá deixando o fato banal, como se pudesse acontecer com qualquer um. Bom, pode, né? Só queria que fosse com ela, e não com essa aqui! Aquele calorzinho que eu sinto, felicidade por estar fazendo o que eu realmente queria, por estar gostando, calorzinho de crush! Não de estar beijando uma amiga. Hum, ela deve ter ciúmes porque eu tive crush nas outras amigas e nela não. Tá, mas isso justifica ela estar tentando tão bravamente? Será que ela tá gostando assim? E se o cara voltar e nos ver e não querer mais ficar com ela? Não tenho nada com isso, mas eu que tenho que ouvir depois! Poderia era ouvir aquela outra falando qualquer coisa da vida dela no meu ouvido, isso sim! Ai, por que eu tô aqui? Por que ela não tá? Que saco. Pera, também não posso fazer cara de “que saco” com a minha língua na boca de outra pessoa. Não nessa ocasião. Ah, ela vai parar, preciso fazer cara de quem curtiu. Hehe! Sim, vamos pegar uma bebida. Ah, eu queria mesmo era que aquela fofa me pegasse pela mão e me chamasse pra tomar um ar.

Texto antigo, problematizações à parte.

sexta-feira, 27 de maio de 2016

Sobre julho

I keep picturing the moment when you will find out that you love me. I know it will be soon and I can imagine exactly the look on your face. You will be holding something, like a cup of coffee or an ice cream, if it's a hot day, but I think it will be the coffee. I will be on your couch and you will be in the kitchen, I will be looking at you. Then I will laugh. You will look at me and won't laugh back, will just make the most surprised face you can and will drop the cup, I will laugh even more because I just can't deal with those silly and cute things that you do, it's too much. I will get up and come closer, you will never look so pretty as in that moment. For the first time you won't even matter if the floor is dirty or not, your surprised face will slowly turn into a smile, the most beautiful smile I will ever see. We will hold each other and you won't be able to say a word, will just shed a single tear. And then I will whisper in your ear: "me too".

sexta-feira, 29 de maio de 2015

Sobre "era complicado"

Fico esperando que aconteça determinada cena, em uma festa, nenhuma das duas sóbrias. Alguma música que a gente conhece tocando. O momento vai ficar em câmera lenta, o som das vozes do meu lado vai sumir, eu vou fazer uma cara triste e olhar diretamente pra ela. A gente vai piscar devagar. Vai demorar um longo tempo, na minha cabeça, até eu desviar o olhar e sair. Vou esperar que ela venha atrás de mim, que puxe o meu braço e nem fale nada. Vai tocar Hero da Regina Spektor como plano de fundo dos meus pensamentos. Ela vai pegar nas minhas duas mãos e olhar pra mim. Vai respirar fundo. Abrir a boca e não saber o que falar. It’s alright, it’s alright, it’s alright. Vai me puxar pra mais perto, apertar mais firme as minhas mãos. I’m the hero of the story. Vai me beijar devagar, lento, como todas as outras vezes, mas mais sério. Don’t need to be saved. Eu vou lembrar da onde é essa música. She never saw it coming at all. Vou sair pro vento da rua, caminhar até um banco, ainda ignorando as vozes ao meu redor, olhar pra trás e ver que ninguém veio. Sentar, acender um cigarro, olhar pra cima. It’s alright, alright, alright.

Eu acho aqui uns textos que eu não sei nem dizer qual era o estado da ebriedade........

quinta-feira, 12 de março de 2015

Sobre as estrelas e o mar

Eu atravessei toda a ilha pra chegar numa praia deserta, onde havia apenas uma casinha de um pescador, no meio do nada. Caminhei umas duas horas. Não levei uma câmera, não levei meu chapéu, não levei nada pra sentar em cima e nem nada pra comer. Pra falar a verdade, não me lembro de carregar nada nas mãos, talvez uma garrafa d'água e um protetor solar. Caminhei por uma trilha sem fim no meio do mato, mas eu já tava tão acostumada a estar a quilômetros de casa, sozinha, que eu nem me importava mais. Quando eu finalmente vi o mar, percebi o erro que foi não levar um chapéu. Sentei encostada num pequeno toco e fiquei um bom tempo olhando pra onde o céu encontrava a água. Não tinha nenhuma casa por perto, mas longe eu conseguia ver um grupo de pessoas brincando nas ondas. Fora isso, era apenas o sol na minha cabeça.
Uns vinte minutos depois uma cadela veio correndo na minha direção e se atirou no meu colo, parecia que me conhecia a vida toda e logo começou a cavar um buraco por baixo das minhas pernas pra se esconder do sol e ficar com menos calor. Desejei fazer o mesmo. Depois de um tempo coçando atrás da orelha dela, um homem muito velho veio andando até nós. Chegou dizendo que ela era uma atirada mesmo, que não vê muita gente e quando vê já se apaixona. Ele sentou do nosso lado e começou a falar, sem que eu precisasse dizer nada.
Morava lá a vida toda, era pescador e vivia dos peixes. Saía de manhã cedo no barquinho, antes do sol nascer. A cadela esperava na beira da praia. Às vezes os netos e os filhos apareciam pra passar um tempo com ele, saíam todos pra pescar em alto mar. Às vezes pescavam camarão. Ele tinha que ir de bicicleta pela beira da praia até a vila, lá do outro lado da ilha, quando precisava comprar alguma coisa. Uma vez por semana, mais ou menos, mas ele disse que era bem chato ter que ir até lá, gostava de ficar sozinho e só conversar com as pessoas que apareciam na praia de vez em quando. Era bem raro voltar pro continente. O que ele gostava mesmo era estender um pano na beira da praia nas noites estreladas do verão e dormir ali mesmo. "E os mosquitos? E ninguém aparece? Não tem bichos?". Não, era só ele, a cadela e o céu. Aí ele disse que precisava voltar pra casa e sumiram os dois no meio do mato, sem antes ela relutar de me deixar ali.
Entrei no mar e fiquei uma meia hora me perguntando como alguém poderia querer algo mais do que aquilo na vida. Aquele pescador, provavelmente, tinha a melhor vida de todo o mundo. Resolvi voltar pela beira da praia, lá pelas tantas eu percebi que foi uma ideia ainda pior do que ter esquecido o chapéu. A caminhada durou mais de duas horas e quando eu cheguei na civilização já tava escuro. Eu tive que passar por dentro de um riacho, quase caindo nos buracos enormes umas três vezes. Tive que passar por uma concentração enorme de quero-queros, que foi o pior de tudo, porque teve que ser pelo meio do mar num ponto que tinha ondas altas e mesmo assim eles davam rasantes perto da minha cabeça. Achei que seria bem absurdo eu morrer afogada E atacada por quero-queros numa praia deserta no meio do Paraná. De todo modo, cheguei na minha barraca, e fiquei pensando que, por mais saudades que eu sentisse, não deveria ser possível que houvesse um outro jeito de viver que não aquele.
E agora eu tô aqui, quase 800 quilômetros longe de lá e sempre me perguntando:
what the hell am I doing here?

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Sobre "parece que faz anos, mas foi em janeiro"

Eu tava atirada numa rede olhando o céu, no pátio de alguém que eu mal sei quem é, ouvindo Armandinho e achando super engraçado o fato de as pessoas acharem muito legal eu ser da mesma cidade que ele, porque lá ele era rei. Naquela época eu morava, majoritariamente, na minha barraca. Naquele dia específico eu morava nos fundos da casa de um casal evangélico que me deu abrigo, dormia perto dos cavalos e dos cachorros, tinha um chuveiro frio, um tanque e uma tela pra me proteger das mutucas. Mas lá na rede eu tava querendo chorar. Às vezes me perguntava o que exatamente eu tava fazendo ali, tão longe do que eu costumava chamar de casa e de quem eu amava. Era a casa de um pescador, eu acompanhava mais dois pescadores e uma prostituta. Uma ilha desconhecida no meio do Paraná, duas horas de barco de Paranaguá, um número baixíssimo de turistas. Teve peixe recém pescado, teve camarão recém colhido. Já fazia três meses que eu não via nenhum dos meus amigos, que eu tava sozinha num lugar desconhecido com gente desconhecida. Eu não tinha medo, em momento algum, só tinha saudades. Aquela música me lembrava de “casa” e me doía quando me perguntavam sobre a cidade que eu nasci e sobre o que eu fazia ali, ainda não sabia direito. Escureceu e eu tive que achar o caminho de volta pra minha barraca sozinha, sem lanterna. Não havia luz nas trilhas, a única coisa que me iluminava era a lua e as estrelas. Me perdi e comecei a ficar nervosa, achei que ia ter que dormir na praia até amanhecer, não ia conseguir achar minha barraca e nem os meus amigos pescadores. No fim, achei a trilha, me tranquilizei, entrei no pátio, passei pelo cachorro que me odiava e fazia um escândalo toda vez que eu chegava ou saía, cumprimentei o cavalo que me fazia companhia. E foi aí que eu olhei pra cima de verdade e vi a coisa mais magnífica. Eu juro que não sabia da quantidade de estrelas que a gente pode enxergar. E naquele pátio totalmente escuro, sem luzes da rua, sem luzes das casas, no meio da noite...eu mal tenho palavras pra descrever o que eu vi. Estendi um pano na grama e deitei. Já não sei dizer se a lua era crescente, minguante, cheia, o que eu sei dizer é que as estrelas cobriam a maior parte do céu escuro, e elas brilhavam de maneiras diferentes, maiores, menores. Formava um brilho em volta de cada uma e depois de longos minutos tinha a impressão de estar flutuando no meio da via láctea. Fiquei, talvez, uma hora olhando aquilo e pensando na minha insignificância, nos últimos meses, nas pessoas que eu conheci e nos quilômetros que me distanciavam da vida que eu costumava ter. Mas bem ali eu percebi que tinha encontrado o que eu tava procurando, que tudo que eu precisava era aquele céu inacreditável pra fazer valer a pena ter deixado tudo e todos. Que eu era tão significante quanto aquele cavalo ou quanto a grama que eu deitava em cima, os pescadores que me providenciaram casa e comida em troca de companhia pra conversar, a prostituta que fugia do marido e sentia saudades da filha, a gente mal importa pra imensidão que é o universo. Ao aceitar isso, dormi duas horas, arrumei minha barraca, peguei o barco enquanto o sol nascia e fui de volta pro sul.

sábado, 22 de novembro de 2014

Sobre ciclo sem fim


"Eu corria desesperadamente até a porta toda vez que ouvia o sinal. Chegava antes que todos no corredor e tentava parecer casual. Fingia ser coincidência eu estar ali pra dizer que gosto da tua camiseta e que não aguento mais ficar na aula. Decorei os teus horários e sabia quando olhar pra escada a tempo de ver teu sorriso descendo. Adorava quando tu passava na frente da minha sala de surpresa querendo matar aula. Sabia exatamente onde te encontrar quando eu fugia da aula, sabia em qual sala tu estaria ou qual lugar escondido tu tinha escolhido pra sentar sozinha e ouvir música ou ler. E isso se repetia todos os dias, que eu acordava apenas pra receber um sorriso e um "bom dia" distante. E foi isso que me matou aos poucos, o preço que eu paguei pra transformar esse sorriso e "bom dia" em um beijo e "te amo" foi o jeito de sorrir que eu tinha.
Morri de leve, pouco a pouco, sem notar, sem nunca voltar."

Sobre esse texto de 2007 que estranhamente se encaixa de leve em 2014. Sobre eu ser dramática desde sempre.

Que exagero.